segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Tempo de Ferver












Já me declarei, inúmeras vezes, uma “paulistucha” convicta, dessas que adotaram o Rio Grande do Sul como território existencial, como lugar para viver, ver crescer os filhos e ver brotar o amor pelas pessoas. Sim, eu amo o Rio Grande do Sul e, particularmente, Porto Alegre. Há muitos motivos para isso, mas, certamente, o clima não é um deles. Falo, especialmente do verão gaúcho, como o que tem marcado os últimos tempos. É de estontear. Tempo de ferver.

Fico observando as pessoas nas ruas, quando não consigo evitar sair de casa e/ou da empresa. Estamos vivendo o que eu costumo chamar de “estado desmaiento”, algo assim como a evidência de um desmaio próximo. Os olhares dos seres que transitam – lentamente, é claro – por Porto Alegre, neste período, são foscos, como de peixes (quase) mortos. São olhares, ao mesmo tempo, cúmplices e suplicantes. Ao nos encontrarmos nos olhares, mesmo nos de estranhos, esboçamos um movimento com a cabeça e uma contração facial, como expressões da cumplicidade “calorenta”. É como se disséssemos ao outro: Eu sei o que você está passando. Eu sinto o que você sente.

Se tentarmos ver algo bom nesse calor, talvez possamos entender que a experiência tenha alguma relação com a expressão “calor humano”. Não... esquece, acho que é delírio “calorento” meu. As temperaturas altas devem estar derretendo o meu cérebro. Calor humano é outra coisa. De qualquer forma, posso deixar a sugestão: que essa experiência de se colocar no lugar do outro, de sentir o que o outro sente possa ser divulgada como a marca do “calor gaúcho”. Dito assim, até pode ser interessante para incentivar o turismo... De novo..., pára, Malu...

Nas ruas, chamam a atenção, também, os olhares de súplica. Há alguns transeuntes que esboçam expressões de desespero – não sem motivo. Escancaram um sofrimento físico, diante dessa espécie de grande forno que “Alguém” abriu e esqueceu de fechar. Escrevi Alguém em maiúsculas, referindo-me a Deus, mas penso que não é justo. Temos que reconhecer nossa parcela de contribuição para o aquecimento da terra. Buraco na camada de ozônio, lembra? Tudo bem, a questão não é mesmo achar culpados, mas buscar estratégias de sobrevivência.

É preciso tomar mais cuidado com a saúde, em sentido amplo, sendo que aí incluo, claro, a saúde das relações. Entre os sujeitos, já há naturalmente o que se costuma chamar de “esquentados”. Imagine o que acontece com eles na fervura de janeiro gaúcho... Estes, nas ruas, tem olhares furiosos. Às vezes, dos carros, gritam, buzinam, xingam... nas lojas, eles impacientam-se com o simples movimento dos vendedores... Olhares carrancudos. Sempre prontos para dar uma resposta. Não levam provocações pra casa...que ninguém faça nada que os contrarie... Ministério da Saúde adverte: esquentados fazem mal à saúde. Em Porto Alegre, no verão, eles são uma ameaça. É preciso atenção e cautela, a qualquer momento pode ser preciso acionar a Defesa Civil.

Deixo, por fim, aqui a sugestão que tenho feito para amigos em geral. É preciso que realizemos um exercício de controle interno para não acreditar na sensação térmica. Defendo uma espécie de programação mental, para amenizar a sensação de mal-estar térmico, ou, pelo menos, para situá-la em níveis suportáveis. Assim, claro, e muito importante, podemos usufruir outros calores, deixarmo-nos envolver por seres querentes, amantes que somos, por natureza...Eu, de novo, e minhas amorosidades... até breve.

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