quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Ninguém tem paciência com o jovem adulto!


Eu tenho dito que um dos problemas do jovem adulto é que ele tem uma metralhadora de desejos dentro de si. É semelhante ao que ocorre na adolescência, com a diferença de que, como diria o Chaves, ‘com o jovem adulto, ninguém tem paciência!’. A adolescência é publicamente reconhecida como uma fase de encrencas, de explosão do sujeito dentro de si mesmo. Então, uma certa revolta ou uma revolta inteira são comportamentos esperados (‘be suppose’ – é esperado que o adolescente tenha certa quantidade de ‘pitis’ e seja indeciso, inseguro, arrogante, petulante, dependente querendo demonstrar o contrário, enfim, um poço de contradições (na verdade, como observam, é um ensaio para ser adulto, as contradições permanecem, por bom tempo e há pessoas em que elas não passam).

Só que o jovem adulto tem tudo isso, com o agravante de que a sociedade e a família já ‘esperam’ uma outra configuração existencial. Ele ainda tem, em si, a metralhadora de desejos, a insegurança, é marcado pela autoestima sempre em xeque (por isso, precisa o tempo todo demonstrar que pode, o tempo todo provar pra si e para os outros que está bem, que ‘é o cara’ ou ‘a guria’. Por isso também, às vezes, não consegue escolher com quem ‘ficar’). O jovem adulto é cobrado, é muito cobrado. Tem que começar a apresentar resultados, para uma sociedade pautada pela produção. Quem está em volta começa a olhar.. meio que perguntando: e aí? Quando vai começar a trabalhar? Se namora, ele é cobrado porque namora, supostamente perdendo tempo que deveria usar para estudar e se preparar para ‘um futuro melhor’ ou para se dedicar ao trabalho...com a mesma lógica. Se não namora, também é criticado, porque ‘é esquisito’, porque não se fixa... porque vive perdendo tempo com amigos ou amigas que não querem nada com nada... enfim... jovem adulto é cobrado a se tornar adulto logo, assumir responsabilidades, partilhar afazeres, começar a cuidar dos mais velhos.

Se uma tia fica doente, o jovem adulto é chamado a ficar no hospital. Afinal, é jovem...e adulto..e supostamente.. não tem muito o que fazer, mas precisa se comprometer com a família. Precisa, verdadeiramente precisa. Chega um tempo que tios e pais vão cobrar os cuidados. Você vai ter que se apresentar e fazer a sua parte. Vai ter que aprender a abrir mão dos seus tempos, do seu planejamento, porque faz parte das suas tarefas, já faz, ser cuidador de quem te cuidou. É assim.

Houve um momento, em que um dos meus amores do tempo do hospital psiquiátrico, me disse, que ia embora, que voltaria para São Paulo, porque a família dele estava precisando que ele voltasse. Ele se especializou em tratamento de pacientes alcoolistas e tinha um alcoolista na família. Tinha certeza que podia ajudar. Eu até que tentei dissuadi-lo, explicando que, na família, somos família, não somos técnicos, especializados em Psiquiatria, com formação para tratar alcoolistas. Somos filho, cunhado, irmão... enfim.. não adiantou. Ele se foi embora e, um tempo depois, me ligou dizendo que o caso do cunhado dele era muito complicado, que ninguém na família o ouvia, que ele não conseguia ajudar. Quer dizer, não adiantou. Nós nos perdemos, mas ele fez o que sentiu que tinha que ser feito. Jovem adulto se iniciando na lida de cuidador.

Grande parte da minha vida eu passo às voltas com jovens adultos, os alunos, sujeitos que têm me dado muitas ‘alegrias’, que me ajudam a reinventar a vida, reinventar a Malu, questionar, pra quem eu dedico boa parte do meu tempo, pensando em como criar situações agradáveis de ensino-aprendizagem. Gosto disso. Amo. Penso que o que me ajuda na relação com eles é a combinação entre a minha maluquice e a minha marca materna, de mãe italiana. Vejo que muitas vezes consigo surpreendê-los. Outras, são eles que me surpreendem. Muitas. Maravilhosas vezes. Sinto também que temos uma relação cúmplice de acolhimento mútuo, de cuidado.

Percebo que a desorientação do jovem adulto é algo que inspira cuidados, que desafia pais e educadores a estarmos juntos com eles, em parceria, entendendo que a preparação para a vida ainda é ‘em caráter precário’. Às vezes, tenho a impressão que os pais querem que o jovem adulto tenha a compreensão da vida e atitudes de acordo com o amadurecimento que adquirimos, a duras penas, sofrendo na pele, as agruras, os contratempos, as consequências dos nossos atos, muitos, errados, atrapalhados. O jovem adulto tem tamanho, tem aparência de adulto adulto, mas está mais para adolescente que adulto. Indeciso, ele oscila. Seus humores também ‘batem no teto’ todos os dias...e os atiram ao penhasco da existência, muitas vezes. Ser jovem adulto não é fácil. Principalmente porque ninguém tem paciência com ele.

Bem...eu às vezes fico pensando nisso e, depois, rio sozinha, quando me vem a frase, trágica para os jovens adultos: ‘Olha, não sei se te consola, mas a tendência é piorar’. A vida do ‘adulto adulto’ essa, sim, é de arrepiar os cabelos (bem, os meus já são suficientemente arrepiados.. não faz diferença)...mas deixa pra lá.. cada coisa tem seu tempo. A gente vai vivendo, vai fazendo, vai tentando acertar. Estamos juntos...

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