sábado, 6 de março de 2010

“Ahhhh! Eu te amo!”

Penso que todo mundo deveria ouvir um dia essa frase. Uma frase dita com gosto. Uma frase que, por si só, expressa a intensidade afetiva acionada no sujeito que produz e, ao mesmo tempo, a densidade do vínculo que está se estabelecendo. Uma frase que remete ao gosto, ao gozo, a uma espécie de explosão prazerosa. Não há, de fato, como descrever a dimensão do prazer de quem produz e tampouco de quem a ouve. Pra quem produz, é pleno gozo, desabafo de uma concentração de excitação, de espera pelo sabor do clímax. O sujeito que recebe a frase tem muitas possibilidades de reação.

Ao ouvi-la, eu emudeci. Inquietou-me, impressionou-me ter emudecido. Sim, porque no meu traço ‘romântica de plantão’ o normal teria sido compor com a frase e admitir sua aceitação e recíproca. Não foi isso que aconteceu. Como sou um ser voltado às explicações. Mergulhei em mim mesma, outro defeito de nascença. Interpelei-me: “Como você emudeceu diante de uma frase dessas?” Tentei argumentar pra mim mesma: “Bom, eu consegui responder com um riso de satisfação”. “Sim, era o mínimo. O mínimo contido”. “Era o possível”, respondi resignada. Fiquei pensando muito nisso, porque esse ‘possível’ indica uma grande alteração. Sinaliza um cuidado. Uma medida de cautela, quase que um programa novo, instalado sem que eu tivesse percebido e do qual ainda não tenho as informações sobre os comandos, as ferramentas. Percebo, apenas, a densidade da instalação.

Chama atenção, assim, que esse ‘programa’ tenha desencadeado, imediatamente, uma inquietação, um questionamento que não ousei formular ao meu ‘interlocutor’ (que termo mais formal para uma situação dessas, sic..!). Fico pensando que não ousei fazer a pergunta, porque, por um lado, ela parece absurda. Quem ouve uma frase assim tem que estar inteira em um contexto e compreender o que a produziu. Tem que estar entendendo seu ‘lócus’ de produção e seus agenciamentos. Claro, ela não surge do nada. Ela surge dos laços que vão se estabelecendo, se constituindo e, como laços, não são dispositivos unilaterais. Eles vão sendo tecidos na relação. Então, meu Deus, por que o questionamento?

Talvez ele seja resultado de marcas de envelhecimento/amadurecimento, de experiências passadas, que me levam à contradição de, por um lado, sempre ter esperado ouvir uma frase dita assim... desbragadamente e, por outro, entender que, apesar do sentido óbvio, ela pode ter outros planos de significação.

Uma possibilidade é que ela seja apenas uma ‘explosão momentânea’, circunstancial, sem a força geradora que a cristaliza na relação, que consolidaria “Ahhh! Eu te amo”, por um certo tempo, ao menos, o que justificaria a sua acolhida desmedida, despudoradamente, sem receios. Outra é que o meu ‘parceiro discursivo’, parceiro da intensidade afetiva, não tenha dimensionado bem a grandiosidade da fala. Sim, talvez ele não tenha se dado conta do que a frase traz como possibilidade de compreensão. Mais provável.

Há, nessas duas análises preliminares, uma pista que se insinua, que a da ‘síndrome da cautela amorosa’, quer dizer: eu não acredito, porque acreditar seria um risco muito grande. Seria permitir-me o lugar em uma viagem sem volta, um passeio pelo mundo da paixão que, junto com suas paisagens fascinantes, seus cheiros, seus aromas afrodisíacos, apresenta pedágios, onde tributos caríssimos têm que ser pagos. Custos do ofício de apaixonar-se. Impostos compulsórios de quem decide percorrer essas estradas do coração. “Meu Deus, tenho poucas economias nesse sentido. Percebo que andei abusando dos recursos. Eles estão meio escassos”.

Subitamente, em meio aos fluxos de pensamentos, uma voz interna me interrompe. É a da Malu, minha voz pouco sóbria, quando se trata de assuntos afetivos. Ela percebe, claramente, que quem escreve um texto assim é a Maria Luiza em mim: “Faz um favor, Maria Luiza, Luiza, Lui, vai pro raio que a parta, antes que me esqueça. Desce desse pedestal de organização, que não combina com a desordem interna deste ser e, nem mesmo, com os sentimentos que produziram a cena. Sai desse mundo do certo do errado, da cautela, do cuidado, porque você não consegue controlar o que vem da emoção. Joga no lixo esta tua capacidade-tendência analítica e responde o que devia ter sido dito na hora: “Ahhhhhh! Eu também te amo”.

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