A pessoa trabalha ‘um mundo’, correndo o tempo todo, para dar conta de
uma avalanche de demandas, todas fundamentais. Há ainda um mar de outros
'a-fazeres', lindos, acionados pelo bel prazer de produzir umas invencionices
na vida, que ninguém é de ferro. Depois de tudo, passa uma imensidão de tempos,
produzindo relatórios da produção, em plataformas variadas, para que ninguém
pense que é improdutiva. Enquanto vai cuidando, milimetricamente, o registro
dos dados, vai pensando que isso não é o mais importante. O mais importante é o
tempo vivido, as produções todas, os acontecimentos produzidos nos encontros
tantos, no dia a dia da vida de uma criatura que vive alegremente o que produz
e se esmera para produzir alegrias nos diversos níveis e materializações. Certo,
certo, na verdade, é isso, mas, há ainda outra verdade, essa publicizada,
metrificada das produções acadêmicas, que diz que é preciso registrar,
alimentar bancos de dados.... Enfim, é a típica situação em que as leoas entram
em ebulição e, desassossegadas, praticam seu esporte favorito: o embate!
Malu: Olha só! Estou cansada! Entendi que a gente vive a barbárie,
também no meio acadêmico. A cada dado que eu registro no tal relatório, fico
pensando “por que trabalhei tanto? Se tivesse trabalhado menos, já teria
terminado”. Agora passo dias cuidando milimetricamente, se estão todos os dados
aí. Conferindo... Que beeeeleeezaaa!
Maria Luiza: Não adianta, Malu. A vida é assim mesmo. Não há como
escapar. Ao contrário. Não queremos escapar. Amamos a vida acadêmica, a lida.
Preparamo-nos muito tempo para esse lugar, para estar formando pesquisadores,
mestres e doutores.
Malu: É, é lindo mesmo, mas nem tudo é lindo. Essa métrica a que estamos
submetidos todos, a engrenagem maquínica que nos conta, nos matematiza, nos transforma
em dados frios, não combina com o ‘mundo da vida da Ciência’.
Maria Luiza: Compreenda, criatura, de uma vez por todas: o mundo da vida
em geral, e também o da Ciência, é mais amplo que a tua dimensão
sentimentalóide poetizante. Isso é uma síndrome, eu acho... não é possível!
Você deveria vir com manual, pra eu saber como acionar o dispositivo racional.
Não adianta. Tem que fazer, faz. Pronto. Não reclama, não te entedia. Abaixa a
cabeça e avança.
Malu: Bem, cada um com suas síndromes. A senhora se acha muito normal,
abaixando a cabeça e produzindo dados para alimentar uma tal coleta, que vai
depois alimentar uma coisa chamada sucupira, junto com um mar de gente que faz
isso também, numa subserviência ao sistema maquínico...
Maria Luiza: Pára! Em que mundo você vive? A engrenagem existe e, para
fazer o que amamos, estamos nela e aí queremos ficar. Então, racionaliza,
criatura. Faz parte, está no ‘pacote’. É uma espécie de ‘combo’ da vida
acadêmica. Você quer viver as graças e alegrias do Amorcomtur, mas se incomoda
de ficar conferindo os dados, postando em três, quatro plataformas...
Malu: Três, quatro, oito, novecentos e cinquenta plataformas a senhora
quer dizer. Cada lugar é de um jeito. Depois, nesse mundo parece que não há
como viver sem um formulariozinho, uma planilha, um relatoriozinho básico, com
dados, claro, conferidos em outras trezentos e cinquenta plataformas, algumas
que não funcionam direito ou que não são ‘amigáveis’, para usar a linguagem da
informática. Sim, porque de amigáveis não têm nada os espaços que você demora
um tempo para abrir... e daqui a pouco se fecham... e outros que você tem que
clicar em um mundo de lugares para se achar o que procura... bah!
Maria Luiza: Você me obriga a me repetir! Não seja dramática! A vida é o
que está! Enfrenta ou, como dizem os jovens: “Aceita que dói menos!”.
Malu: Que engraçadinha! Agora a senhora resolveu fazer graça... Que
beleza! A pessoa se esgualepando em meio a turbilhão de coisas para fazer, e a
outra brincando...
Maria Luiza: Você já deveria me conhecer e saber que brinco bem pouco na
vida. Sou prática operacional. Não faço drama, nem comédia. Só vivo. Cada dia
de uma vez. Só isso.
Malu: Uff... prática operacional. Claro, não há nada mais conveniente à
engrenagem maquínica. Um ser prático operacional. Parabéns! Que orgulho! Você não
se irrita, não se abala, tem esse tom majestoso, de que acha que sabe tudo,
acha que sempre sabe o que fazer.
Maria Luiza: Criatura, não delira! Estou muito longe de ser assim. Se fosse,
já teria arrumado um jeito de me libertar de você e da tal Luiza. Vocês me
atrapalham. São cheias de sentimentos, de amorosidade, de poesia. Ao contrário,
com essa imensidão de afeto de bem-querer-bem, diante da impossibilidade de me
livrar de vocês... acabei concordando em fazer da vida... Amorcomtur! Penso que
agora é tarde para ser diferente. Quando vejo, eu mesma ando postando por aí:
#souAmorcomturemtodaparte.