Às vezes, percebemos que passamos grande tempo da vida
dependurados em uma estrela imaginária. Linda, intensa, aparentemente perfeita.
Perfeitamente imaginada! Depois, aos poucos, vamos percebendo que ela, a
estrela imaginada, nos escapa, à medida que vivemos. Vai se denunciando, na sua
condição imaginada, se mostrando mais etérea do que deveria. Escapa-nos aqui e
ali. Não, ela não estava sempre ali, como esperávamos e supúnhamos. Não, ela
não tinha tanto brilho quanto era necessário, quanto necessitávamos. Mas,
então, o que foi feito da estrela perfeita, que por tanto tempo se nos
apresentou? Então era tudo mentira? E as vozes que ouvíamos do oráculo, dizendo
que tudo estava escrito nas estrelas? E a certeza que tínhamos no coração de
que a estrela, aquela, era a mais linda e certa inscrição das nossas vidas e
que nos levaria para o mundo que sonhamos, onde haveria sempre amor, onde as
amizades fossem sempre verdadeiras, onde o abraço fosse sempre sincero, onde poderíamos
suportar a todos os desafios, porque tínhamos cada ponta da estrela, como
segurança, como porto seguro?
Chego à conclusão que não havia nenhum problema com a
estrela, com o que existia dela, de fato. A estrela era verdade, mas não como a
víamos. Nós víamos a imaginação, a estrela imaginada. Essa, sim, inspira
cuidados, porque era idealizada, porque era sonhada e construída dentro de nós.
Não há como buscar fora a estrela que temos dentro. Ela existe como referência
de brilho, de intensidade, como condição amorosa e orientação da vida. Ela
existe, mas não no Outro ou em um projeto específico. Ela existe como nossa
potência de construir estrelas. Isso não é ruim, a menos que esperemos que o ‘fora’,
o Outro, o projeto dê conta da idealização. As coisas são como são, não como
imaginamos. As pessoas também. Depois de constatar isso, você só tem que decidir
se continua ou não na estrada que tinha escolhido, com base na idealização da
estrela imaginada. Você tem que decidir se ama, assim mesmo, conhecendo a
estrela nas suas imperfeições e incompletudes, na sua humana e real condição
imperfeita, como de resto é tudo e qualquer coisa e somos todos nós.E também
tem que se contentar com o fato de que a estrela se movimenta por conta
própria, independente da sua vontade.
Outro desafio imenso, nesse sentido, pra quem tem o hábito
de imaginar estrelas perfeitas é compreender o giro do Universo, o fato de que
nada permanece no mesmo lugar muito tempo. Tudo está, o tempo todo, em processo
de mutação. Tudo se movimenta. O encantamento com a estrela imaginada faz com
que o sujeito tenha desejo de que nada mude, de que tudo permaneça onde e como
está. Ao contrário disso, nada permanece. Tudo está em transformação em cada
instante. Isso não significa que se modifica pra pior ou pra melhor, mas que se
movimenta o tempo todo. Não adianta espernear. O instante passado é passado
e somos chamados a fazer nossa parte
para garantir o devir, o instante que deve vir a ser. Isso só é possível
valorizando o instante presente, o que temos. A sabedoria oriental valoriza o
conceito de ‘presença plena’, que aprendi a partir do chileno Francisco Varela,
no livro De corpo presente e depois amadureci treinando karatê e aprendendo as
orientações do Caminho. É preciso aprender estar plenamente presente onde se
está e reconhecer as condições reais para que possamos agir, intervir no mundo,
no universo, no nosso universo existencial. Um pouco de vetor prático
operacional ajuda a conviver com estrelas reais e imaginárias. Assim, é fácil não
se decepcionar com estrelas. É só não esperar delas o que temos dentro de nós,
como imaginação.
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